O problema principal do Mediterrâneo é a
ausência de correntes e marés fortes. Outro problema, é a crescente população
costeira e o excessivo afluxo turístico sazonal. É preciso por isso gerir os resíduos
daí resultantes, o que apenas começou a ser feito há pouco tempo (cerca de 15 anos). Os
municípios costeiros não se encontravam bem equipados a nível de estações de
tratamento de águas residuais, incineradoras, ou sistemas de limpeza do litoral. Servindo
assim, o pobre Mare Nostrum, de exutor submarino tanto para resíduos urbanos como para
resíduos industriais. Actualmente, através da cooperação intermunicipal, praticamente
todos os municípios se encontram equipados com o objectivo de reduzir o impacto da
pressão antrópica e dos resíduos por ela originados. No entanto este objectivo está
longe de ser alcançado no litoral mediterrânico. A vigilância tem de ser diária por
duas razões principais: a corrente Ligúrica e a falta de civismo de quem frequenta o
litoral.
Abençoados vizinhos italianos
Não é
minha intenção atirar a primeira pedra. O que não me impede de juntar algumas
pedrinhas. A corrente Ligúrica vinda de noroeste, que contorna o golfo de Génova e
áreas próximas, em Itália, distribui-nos tudo aquilo que junta à sua passagem.
Primeiras áreas afectadas; os Alpes-Marítimos que se vêem obrigados a limpar
constantemente praias e enseadas, Var que investiu em ancinhos e máquinas para limpeza
das praias, Bouches du Rhône que começa a fazer má cara, e finalmente, Hérault onde os
macro-resíduos se tornaram numa grande preocupação. Bem, passemos ao âmago da
questão.
Macro-resíduos e hidrocarbonetos
Quando
se fala em macro-resíduos, pensa-se frequentemente nos detritos resultantes da acção
humana que encontramos nas praias, lembramo-nos menos dos detritos «naturais», ou seja
dos pedaços de madeira e folhas mortas das posidónias. Mas se há um tipo de
macro-resíduos em que nem sempre se pensa, são os hidrocarbonetos que não deixam de
ser, contudo, os mais prejudiciais!
Diversos municípios mediterrânicos, nomeadamente da Córsega, queixam-se das grandes
quantidades de alcatrão que dão à costa. Este alcatrão, praticamente inalterado, dá
à costa sob a forma de pequenas bolas provenientes das manchas resultantes do deslastre
de navios por capitães pouco escrupulosos. Contudo, a convenção internacional MARPOL
que regulamenta os despejos dos navios no mar, classificou o Mediterrâneo como «zona
especial». Significando que é proibido qualquer despejo no mar, seja qual fôr a sua
natureza (lixo doméstico, hidrocarbonetos, etc.)!
Proibido... Isso parece não significar grande coisa para determinados capitães que
efectuam a desgaseificação antes de chegarem ao porto ou depois de já estarem ao largo.
Se é verdade que não existe uma solução «milagrosa» para limpar as praias do
alcatrão que dá à costa, existe no entanto desde há pouco tempo forma de prevenir este
tipo de poluição. O programa «OILWATCH» no qual participam activamente cinco países
europeus (França, Itália, Espanha, Portugal e Grã-Bretanha), permite actualmente
detectar manchas de hidrocarbonetos via satélite (Radarsat & ERS2), bem como a sua
utilização pelas autoridades competentes na luta antipoluição marinha. O tratamento
rápido das imagens recebidas via satélite permite lançar o alerta e utilizar os
recursos das Autoridades Aduaneiras Francesas no Mediterrâneo (na zona de vigilância
francesa) para confirmação, e se possível constatação de flagrante delito. Entre
01.02.98 e 31.08.98 (primeira parte da fase piloto do programa), o satélite Radarsat
detectou 51 descargas de petróleo em 25 imagens repartidas pela zona mediterrânica desde
o golfo de Lion até ao golfo de Génova. No mesmo período, o avião especializado POLMAR
2 das Autoridades Aduaneiras Francesas detectou na zona de vigilância francesa 59 manchas
no decurso de 29 vôos ! Visto que, a fiabilidade na detecção de manchas de poluição e
o tratamento das imagens via satélite tem vindo, constantemente, a aumentar, os
intervenientes no programa concentram-se agora em incrementar a rapidez de actuação e a
frequência das observações, agilizando procedimentos, com o objectivo de surpreender
navios em flagrante delito, enviando ao sítio certo, no momento certo, uma autoridade
competente. O receio de ser supreendido pelas autoridades terá certamente como efeito, a
redução do número de desgaseificações e consequentemente do risco de poluição do
litoral por hidrocarbonetos.
Subavaliação dos inconvenientes causados pelos resíduos abandonados
A
inexistência de uma definição sobre o carácter poluente dos macro-resíduos conduz a
uma avaliação fortemente subjectiva dos mesmos por parte de Entidades públicas ou
privadas. Estes resíduos são então abandonados, frequentemente com a ideia de
"não serem poluentes" - foi dita a «palavra mágica». Conduzem no entanto à
degradação da paisagem, provocando danos no meio ambiente e custos elevados para a sua
recuperação.
Resíduos resistentes em circulação constante
Os
macro-resíduos podem ser motivo de lutas importantes, mas também podem tornar-se
progressivamente parte da paisagem se não forem tratados (zonas de díficil acesso,
baixios). Determinados tipos de detritos (vidros, plásticos, metais) resistem durante
muito tempo. Entre estes detritos, os plásticos, a madeira, as folhas das posidónias,
etc., têm uma densidade que lhes permite flutuar e, arrastados pelas correntes, dar à
costa. Podem afundar-se, ser novamente postos em circulação pelas tempestades e, de
novo, dar à costa. As chuvas abundantes e as enchentes das bacias hidrográficas podem
igualmente contribuir para a chegada de detritos ao meio marinho. O litoral é um receptor
por natureza. Estas deslocações cíclicas revelam o seu impacto local, nacional e
internacional. A problemática dos macro-resíduos no litoral faz com que cada um de nós
reconheça o seu papel na degradação do ambiente. . .
Isabelle POITOU "Mer et Littoral"
